Para pacientes com obesidade, uma perda de peso modesta, geralmente acima de 5%, já está associada à melhora clínica, enquanto perdas de peso de 10% a 15% trazem benefícios ainda maiores, independente do IMC final. Classificar o IMC, e querer que o paciente atinja um “peso ideal” baseado em sua altura, é uma proposta utilizada a muito tempo por muitos profissionais da saúde, inclusive nutricionistas, mas que vem se mostrando não ser a melhor ferramenta para avaliar a obesidade e estipular metas de peso que em 99,99% dos casos são inalcançáveis.
Em abril de 2022 a Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabolismo (SBEM) e a Sociedade Brasileira para o Estudo da Obesidade e da Síndrome Metabólica (ABESO) propuseram uma nova classificação da obesidade baseada no peso máximo alcançado na vida (PMA).
Nessa classificação, os indivíduos que perdem uma proporção específica de peso são classificados como tendo obesidade “reduzida” ou “controlada”. Essa classificação simples – que não pretende substituir outras, mas pode servir como uma ferramenta adjuvante e também ajudar a disseminar o conceito de benefícios clínicos derivados de uma perda de peso modesta, permitindo que indivíduos com obesidade e seus profissionais de saúde se concentrem em estratégias de manutenção de peso.
Mesmo perdas de peso modestas estão associadas a benefícios de saúde e qualidade de vida. Várias diretrizes sobre o tratamento clínico da obesidade indicam que perdas de peso de 5% a 10% são clinicamente significativas e recomendam essa faixa como alvo de tratamento. Perdas de peso de 3% ou menos estão associadas a benefícios na fertilidade e nos níveis de glicose. Alguns autores sugeriram que uma perda de peso de 3% pode estar associada a uma menor probabilidade de complicações de doenças infecciosas, incluindo COVID-19. Quando acima de 5%, a perda de peso tem efeitos significativos nos marcadores metabólicos (como o HDL-colesterol), depressão, dor nas articulações e função sexual. Uma meta de perda de peso de 7% foi associada a um menor risco de diabetes tipo 2 no estudo do Programa de Prevenção de Diabetes, no qual cada quilograma perdido foi associado a uma redução de quase 16% no risco de diabetes. Perdas de peso acima de 10% têm efeitos importantes na esteatohepatite.
Como seria essa nova classificação?
Imagine um indivíduo que chega em seu consultório pesando 115kg e estatura de 175cm, classificando-o apenas pelo IMC, ele se encaixaria em obesidade grau II e uma conduta médica/nutricional seria tomada e passada para o paciente, talvez já primeira consulta uma meta de peso ideal seria estabelecida. Com esta nova proposta de classificação, o IMC seria classificado com base na trajetória de peso e no peso máximo alcançado em vida. Então o paciente relata que seu peso máximo foi de 118kg – IMC 38,5 kg – Obesidade grau II (a nova proposta considera que este peso máximo tenha sido de pelo menos 3 meses). Logo, ele obteve uma perda de peso de 3Kg, isso representa 2,5% baseado na nova classificação ele seria (Obesidade classe II inalterado), pois houve perda de peso menor que 5% (em relação ao peso máximo).
Durante o acompanhamento o paciente perde mais 10kg, isso representaria 8,5% de perda de peso em relação ao seu peso máximo, pela nova classificação ele seria – obesidade classe II reduzido). Em uma nova consulta, ele perde mais 15kg, ele ainda seria classificado como obesidade grau II, porém pela nova classificação, obesidade classe II controlada, pois representaria 12,7% de perda de peso.
Perceba que, na classificação tradicional o paciente, mesmo tendo uma perda de peso bem considerada, e isso além de refletir na balança refletiria na saúde também, ele ainda é classificado como obesidade grau II, isso muitas vezes deixa o paciente frustrado e desestimulado, pois ele ainda não está em seu “peso ideal” e muitos profissionais, por falta de conhecimento acabam enxergando o paciente apenas como um número na balança e na classificação de IMC “ele tem que ficar em eutrofia para o tratamento ter tido como sucesso” e isso já faz um bom tempo que a ciência vem mostrando que não é bem assim.
O documento publicado relata que esta nova ferramenta de classificação deva ser usada apenas em pacientes adultos obesos, ou seja, com classificação de IMC acima 30kg/m² até 50kg/m² pois ainda não está claro se as porcentagens usadas neste grupo se aplicaria aos acima de 50kg/m², além disso, no caso de mulheres, não se deve considerar o maior peso de vida o da gestação, pacientes que pararam de fumar recentemente, medicamentos hipoglicemiantes associados ao ganho de peso, hipercortisolemia exógena ou endógena, idosos, crianças e adolescentes e indivíduos com doenças crônicas em estágio terminal.
REFERÊNCIA
HALPERN, B., MANCINI, M. C., MELO, M. E. DE ., LAMOUNIER, R. N., MOREIRA, R. O., CARRA, M. K., KYLE, T. K., CERCATO, C., & BOGUSZEWSKI, C. L. Proposal of an obesity classification based on weight history: an official document by the Brazilian Society of Endocrinology and Metabolism (SBEM) and the Brazilian Society for the Study of Obesity and Metabolic Syndrome (ABESO). Archives of Endocrinology and Metabolism, 66 (Arch. Endocrinol. Metab., 2022 66(2)). https://doi.org/10.20945/2359-3997000000465
Como referenciar este post?
MACHIAVELLI, Sabrina. Nova proposta de classificação da obesidade baseada no histórico de peso. Post 398. Nutrição Atenta.
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